7 de junho de 2011

GD 96 POR UM MUNDO MAIS VELHO....


Sinto hoje uma melancolia saudosista. Depressão leve de quem tem nessa palavra única e escrita apenas em português um refúgio. O fato de, há quatro dias não ingerir nenhum tipo de droga ilícita talvez tenha algo com esse sentimento. Mas isso apenas explica o sonho dessa noite, onde o apresentador Edgar dançava freneticamente embaixo de uma jaboticabeira azulada, ouvindo os acordes da banda Pearl Jam que tocava em um sítio próximo à casa de meus pais. Completando o quadro, dois policiaís prendendo um garoto obeso com uma cartela de medicamentos alaranjados e vermelhos, assim como meu baseado enterrado no chão de terra fofa que me servia de poltrona no barranco. Para a minha sorte, escapar desse temor foi simples, quando abri os olhos.

Acordar para o mundo em sua volta e perceber que algo está faltando.

Mas a saudade é de algo que não foi vivido. Vácuo semeado por letras e palavras que apenas consegui absorver depois. Traços de uma morte lenta que chega com a mais silenciosa das passadas, e te leva longe quando sua respiração para pela última vez. Assim sereno, o partir de um corpo é anunciado pela alma que se descola do cadarço de seu tênis predileto.

O mais engraçado é saber que essa sensação me persegue há tempos. Quando estudava na Escola Estadual Caetano Lourenço de Camargo, local onde meu karma bullynístico foi pago com juros altos e paixões incompletas, participei do primeiro jornal escolar. Função de escrever resenhas sobre filmes.
Minha curta carreira promissora como Bangs jauense terminou quando, a professora de Educação Artística leu os textos sobre 2001 e Laranja Mecânica. Corada de vergonha pela comparação entre a cena do estupro com a falta de preparo que a escola tinha, dispensou-me dos afazeres. Novamente minhas notas seriam dadas por desenhos copiados em uma seda, que também me acompanhou em boa parte da vida.
Mesmo que queimada.


Desde aquele tempo minhas preferências eram por coisas que não conhecera ao vivo. Sinto falta de Velvet, Stooges, Boham e Lennon. Mutantes (os primeiros), e Altamiro. Machado e Pessoa.
Pessoas que não cheguei sequer a ver pela televisão. Quanto mais ao vivo.
Escuto ali meu choro pelas linhas traçadas por jornalistas que não escrevem mais suas colunas. Textos longos e anfetamínicos de alguérm que nunca vi e provavelmente jamais saberá de minha existência. Como ter dentro do peito a falta de algo não vivido?

O tempo hoje é mais rápido. Os dias estão cada vez mais curtos e contados em milionésimos binários. Uma corrida desenfreada, catarses de segundos que duram o tempo de uma ejaculação cultural precoce. De que adianta saber que a banda russa Motorama fez um dos melhores discos de 2010 assim como a Degrees esse ano. Não existe uma razão para alardes e textos, pois tudo isso torna-se obsoleto demais através dos dias. Não existe mais a sensação de que as canções ou sentimentos grudam em seus ventrículos e de lá não sairão nem por uma lavagem ácida. Tudo é uma gota que dissolve e mais nada, salinizada por alguns olhos passageiros.

E a velocidade que consome, também nos trai.
Dia desses, por entre os magos de plantão li uma frase dizendo que não precisamos mais de pessoas como essas. Massaris e Álvaros que descansem em paz, pois de nada adiantam suas linhas. Hoje somos todos jornalistas em tempo real, fatos regurgitados e escaneados pelas assimétricas linhas de uma tela que se desgasta. O tubo de plasma é agora tão parecido com o corpo humano, que vai aos poucos perdendo suas funções. As máquinas estão mais próximas da criação divina do que sua imagem e semelhança. Como diria Waters:
Bem vindo à Máquina...


 Perde-se a vida, ganha-se a velocidade. Mas e a catarse necessária para que possamos andar na direção da evolução, onde fica?
Não fica, some. Por isso é tão difícil definir e conseguir aglomerar pessoas com um denominador em comum nas ruas. Todos tem suas agendas e repartições políticas.
Neonazistas, homossexuais, heterossexuais, esquerdistas e conservadores. Todas siglas rápidas e que são tão passageiras quanto aquela música que salvou o mundo a semana passada. Não existem mais fortes idéias que permanecem por entre os cérebros polinizando mudanças. Apenas um aglomerado de palavras, balões de hélio risonho. Escrotos que balançam tontos por entre lábios de uma vagina inexplorada e sedenta.
Todas siglas com interesses e diretrizes. A divisão de castas humanas é tão vasta quanto os artigos da wikipédia, as bandas do myspace ou bandcamp. Todas rápidas quanto os acordes que já não mais causam comoção em massa.

Isolados estamos em um cordão de rapidez binária que não contempla mais o saber. Por isso é mais do que necessário os olhares para o admirar das palavras escritas por todos esses senhores, que já velhos ainda lutam em campos virtuais. Perceber os seres humanos como criadores e entender que mesmo tudo ao alcance de nossos teclados, precisamos dessas linhas como guia. Não é porque eu sou capaz de descobrir aquela banda fantástica da parte setentrional da Malásia Oriental, que preciso descartar as ecdises que podem acontecer por entre os textos do passado. Remixar idéias é algo tão fantástico que deveria ser uma lei universal. Unir aquilo que não se viveu com a mais nova e veloz tecnologia.

Não meu binários leitores, não podemos deixar de nos emocionarmos pelas palavras do velho. Não devemos sucumbir à essa velocidade, sem lutar por mais palavras. Obviamente não posso defender um "escritor" que tem textos longos e usa a palavra "xota" para definir o sexo feminino, mas é preciso acabar com o isolamento de achar que somos as próximas deus ex-machina desenhadas pelo evangelho de Morpheu.

Não somos.

Estamos perdendo a batalha por nossas almas pela prepotência em pensar que podemos ser maiores do que tudo. Separados por graus de cento e quarenta caracteres que tem a audácia de codificar a genética humana.
Pois como diria um sábio de nosso tempos binários:
"Remixar o passado é uma evolução do presente".