3 de novembro de 2011

GD 116. O TROVADORISMO BREJEIRO


 O interior de São Paulo reflete quilômetros em diferenças entre o cotidiano dos pés em vermelho terra e a poluição octaedra da capital. Por mais que tenha-se uma pretensa calmaria dentro da brejeirice dessas antigas cidades colonizadas na era do café, a lava que escorre pelas veias dos habitantes canavieiros é algo que nasce independente da formação e do lugar. Inquietude é uma característica tão ímpar dessa helicoidal cadeia que fica quase impossível retirá-la. Mas isso pode ser uma faca de dois  potentes cortes hattorianos.

Se por um lado o marasmo do interior cria a vontade em transcendência criativa, também assola a evolução das pessoas com a mesma força. O colunismo social das famílias e seus nomes expostos nas paredes de Igrejas Matrizes, a loucura em disputas de heranças por filhos dos casamentos co-sanguíneos e a quantidade das drogas dopando o viver, são tão enraizados quanto a cadência de criação. Por isso, pessoas que rasgam essa característica homicida da natureza humana nessas cidades, possuem muito mais força.


Força que está decodificada em cada acorde nas canções de Cleiton Rolo. Conterrâneo de um outro vórtice dessa genética, o cantor Rafael Castro, seu primeiro EP cai na binariedade essa semana. Com exatidão de horas, a mini bolacha possui quatro faixas (A Cia. dos Ásperos Tristes, Bem Aqui, Love Fits Like A Glove e Eu Quero Rotular Você).
São trovas que  descrevem sentimentos tão palpáveis quanto os gomos de laranja que padecem no solo ao redor das estradas interioranas. Uma equação orgânica falsamente matemática, pois transparece o que corre por entre a alma. Até quando peripécias quase cinícas presentes na letra de Eu Quero Rotular Você, podem deixar um ar de humor negro.

Tons recobertos não apenas de riffs, mas assimetrias lisérgicas em pequenas doses. Uma largada pelos arredores cerebrais mais incandescentes desse interiorano compositor. A dualidade entre o ser e o não querer manter-se geograficamente posicionado dentro desse mundo, que por muitas vezes parece outro planeta. Na tragicamente doce letra da canção Bem Aqui. Só quem nasceu nessas bandas sabe o que significa a tal da azia que Cleiton descreve tão bem.
 Os ásperos impropérios de uma relação tão trágica quanto cômica, na trovadorada em Cia dos Ásperos Tristes padece de maiores explicações. O levar barroco rococóniano dessa canção é preciso, e faz com que esses dois minutos e dezenove segundos sejam o início perfeito.

Canções e reflexões brejeiras feitas por quem sabe muito bem o que é ser interiorano, mas com força de transcendência muito maior do que a geografia mórbida.
Ouça o Ep abaixo, que tem a faixa título para download no site do cantor.