18 de novembro de 2013

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Perfil narrativo fictício

#MOOCStory Task 3

O mundo é um lugar escuro.
Somos expulsos do útero materno dentro de uma massa terrena onde a violência se incia no momento da concepção. O sangue, a dor e a hipóxia são as companheiras na nossa chegada. Talvez seja por isso que nos dão um nome, para que todas essas coisas sujas que acontecem desde nosso nascer não sejam a lembrança infiltrada em nossas mentes, mas sim um lindo nome cristão e doce.
Porém meu nome é apenas um nome, minha denominação dentro desse mundo é apenas uma marca, como as milhares de cicatrizes que tenho espalhadas pelo meu corpo de pele negra.
E este nome mundano jamais será maior que minha missão.
Missão designada desde minha vinda, naquele domingo pela manhã dentro de um barraco sujo em uma das casas mais simples da Favela do Moinho. Minha mãe, Maria de Nazaré, contorcendo-se pelas dores imensuráveis ao parir uma criança fruto de seguidos abusos feitos pelo marido bêbado e viciado em crack. Maria morreria após o parto, pelos pontapés de meu pai em sua cabeça e eu seria jogada dentro dos canos de esgoto, vagando pelas sujas água do Rio Tietê, amparada por ratos e abutres que se alimentaram dos restos de placenta que sobraram em meu corpo. Suas mordidas deixaram marcas que cresceram paralelas em meus longos braços. Também arrancaram pedaços de minha pele nas mãos que jamais cresceriam novamente, por isso hoje uso luvas para esconder as cicatrizes maiores. Como maior paradoxo, minhas mãos são as partes mais importantes de meu corpo, que foi preservado pelos ratos. Isso fez com que minhas pernas e tronco crescessem de maneira correta, deixando-me com um metro e oitenta centímetros de altura e sessenta e nove quilos perfeitamente distribuídos. Meus músculos com exatidão e força, moldaram um corpo repleto de beleza que se completa pela minha pele negra. Pernas bem torneadas com um pequeno desvio no joelho esquerdo, meus tornozelos cresceram com cicatrizes de todas as vezes onde fui presa e torturada por meus inimigos. Alguns centímetros acima de meu quadril uma cicatriz da barra ferro que perfurou minhas costas e atravessou meu útero indo exteriorizar-se em minha vagina, quando fui capturada a primeira e única vez pela Polícia Federal, acusada de assassinar o ex-prefeito Gilberto Kassab. Nessa mesma captura fui estuprada diversas vezes por dois apresentadores de programas policiais da televisão, que recebiam propina do governo do Estado.
Mesmo assim jamais perdi minha força, ela apenas tornou-se maior
Ela foi transferida aos meus olhos de cor castanho escuro e meus encaracolados cabelos que mantenho a maioria das vezes preso em um rabo de cavalo, porém quando necessário deixo-o solto e repousando ao redor de rosto angulado, enfeitando minhas orelhas e nariz pequenos. Meu cabelo também me ajuda a esconder uma enorme cicatriz ao redor de minha têmpora esquerda, feita pela faca de meu pai em nosso último encontro. Nesse dia, um de meus nomes nasceu. O nome pelo qual sou conhecida pelos meus inimigos, o nome que meu pai me deu antes de cortar sua garganta com minhas unhas.
Ele me chamou de Meretriz do Lixo.
O povo brasileiro entretanto me conhece por Nossa Senhora do Moinho.

Hoje, aos vinte e sete anos, sou uma mulher que não busca apenas a vingança dentro de uma sociedade doente, sou vista como uma heroína para aqueles que não tem mais esperança. Mas eu não vejo assim, eu sou apenas uma mulher que procura a justiça e a redenção. E o meu maior desejo é terminar minha missão, a lista de assassinatos e a destruição de meus alvos. Não tenho medo em minha alma e meu coração está calmo, a vingança é a única coisa em que acredito e minha confiança não cabe à ninguém, do mesmo jeito que por segurança de todos meus amigos, não os tenho mais.

Meu ódio nasceu e cresceu por causa de meu pai, que após meu nascimento tentou me matar jogando-me no esgoto e assassinou minha mãe com pontapés. Depois disso meu ódio foi cultivado por misóginos e políticos que encontrei pelo caminho, além dos religiosos que me estupraram e corromperam minha alma em nome de Deus.

Esses inimigos todos terão seu fim.

Minha lista de assassinatos iniciou-se com meu pai e agora reduziu-se aos cinco homens das fotos de meu perfil. Do mesmo jeito que minha lista de lugares a destruir. Todos meus piores inimigos.

Atenham-se meus compatriotas, pois sempre que uma sombra recoberta em couro negro cortar os céus da cidade, o sangue será derramado e nossos filhos serão vingados.