7 de outubro de 2011

GD 113 A INVASÃO CHINESA...


Na falta da existência consistente nos arredores da alma quando o assunto é categorizar alguma coisa, o mais importante é apenas deixar-se levar pelos acordes e nunca tentar fugas por entre adjetivos carcomidos. Dentro de uma sociedade tão comparativa quanto a que vivemos atualmente, o excesso de regurgitação das eras musicais geológicas mostra que fica muito difícil não existir comparação com as bandas que povoam nosso mais libidinoso imaginário. Em moradas de escafandros claustrofóbicos, é uma tarefa quase tão impossível quanto arranjar uma agulha dentro no fundo do oceano. Contudo a categoria deixar as sinapses sentirem e não falarem, é quase uma perdida arte meditacional. Até quando o rock chinês ocidentalizado, transborda os maiores sorrisos estridentes em riffs tão analógicos quanto as agulhas de acupuntura feitas com pedaços de bambus.

Carsick Cars poderia ser a sua banda predileta dos tempos de colégio, ou tocaria na festa universitária mais descolada ao final dos anos 80. Mas essa última afirmação não poderia ser verdade, pois além de contemporâneos dos anos onde a binariedade já ardia em febre galopante, o trio possui mais fôlego do que apenas a vil mistura entre navalhas, robôs e uma cozinha trepidante. Uma discografia que pode ser tudo, menos minimalista. Influências definidas em cada acorde e que não deleitam dúvidas sobre como a construção das canções são formadas.


Nascidos em 2005 e apresentando-se pela primeira vez na Faculdade de Tecnologia de Pequim, não demorou para que uma legião de ávidos compatriotas catapultassem a sonoridade para o mundo. Mesmo com a germinação precoce, o trio viajou com a Sonic Youth abrindo shows em Praga e Viena. Mas as ligações comerciais com o ocidente ainda estavam longe de terminar. Como o país de origem, a invasão desse produto chinês da mais original qualidade estava apenas começando.

Durante um show em Nova Yorque, John Myers (sim ele mesmo), ficou completamente louco com a banda. Contudo e pelas graças yangnescas, não seria o cantor que faria com que a banda desse um passo adiante. Ele foi apenas o meridiano de energia necessário para que a Carsick Cars encontrasse seu vaso governador, o produtor Wharton Tiers (Sonic Youth, Dinosaur Jr. e Helmet). Não é preciso dizer que a ligação entre essas duas hecatômbes musicais resultou em um dos belos discos de 2009. Originalmente lançado naquele ano, mas com um relançamento mundial marcado para outubro de 2011.

You Can Listen, You Can Talk tem tudo para lembrar o ouvinte porque uma banda de rock é a melhor manufatura inventada pelo homem moderno. Mesmo com a síndrome da limpa produção, o disco é repleto de experimentações. Canções hemácias em lava, que deixarão seus ouvidos sangrando claves de sol durante horas e horas impossíveis de contabilizar no passar dos anos. Pesado quando deve ser e elaborado nas passagens do tempo onde a contemplação é necessária. São arranjos exatos e assimetrias bem concatenadas. Subterrâneos em veludo repletos da mais hipnótica juventude sônica.



Com letras em inglês e chinês, o disco é de uma embriaguez notável. Não aparenta ter a duração que tem, pois a hipnose tem um alto nível de penetração liquoriana pelas suas veias abertas e sedentas por riffs. Mesmo mais engomada, a equação dentro dos sons é um dos registros que valem a audição em vezes variadas. Tudo que um belo disco de rock deve ter e um pouco além. Um amálgama de guitarras, baixo, bateria e uma enorme porção de alma que esparrama por entre os acordes.

Também é digna de visita as canções dos projetos paralelos do trio. Li Quing (baterista) e Li Weisi (baixista) são fundadores da Snapline que tem como produtor de seu disco de estréia o baterista da PIL, Martin Atkins. Shou Wang, o vocalista tem o projeto experimental White. Além de apresentações com orquestras e outros músicos, é considerado um dos mais inovadores guitarristas chineses da história.


Ouça You Can Talk, You Can Listen abaixo e depois a estréia da banda, que ganhou o codinome de Panda Noise. Esse disco aliás tem uma estreita correlação com o próximo post do blog. A produção foi feita por um dos pilares dentro da cena de rock chinesa, o líder da legendária banda P.K. 14, Yang Haisong.