4 de dezembro de 2012


Por ser marginal, atira-se aos pedregulhos em pulmões metálicos embebidos nos restos cancerígenos, onde certas displasias do mundo teimam em convencer que as metástases são mais benéficas do que malignas. Mas por ser marginal, também - e por isso mesmo -, tem em sua alma o fardo de um sorriso à prova de balas. Mesmo que esse desejo seja apenas um desejo e jamais se concretize.
Porém, é possível sentir, a cada respiração dessa artéria bandida da vida, que amalgamar as balas secas e torná-las pequenos celestiais pedaços de arte pode ser uma inversão da inversão na formação de imagens da retina.

Como se ao tempo em que você assiste alguma coisa, seu cérebro automaticamente transmitisse em sua retina virtual uma versão de trás para frente do que você assiste no momento presente.

Mas essa marginalização do sentido humano mais pobre - a visão -, pode ser transformada em enigmas e citações. Vulcanizada em sensações e desesperos de um planeta telexiado repleto de personagens onde suas funções são nada mais e nada menos do que perpetuar a natureza mais amalgamadora do ser humano. A que foi despertada quando nosso irmão símio pegou o primeiro pedaço de osso e assassinou a primeira capivara em busca de comida. Tornando-se a síntese do carnívoro violento, evoluindo para o que hoje tornou-se banal. Entretanto existe um aspecto dentro do novo clipe da banda Krias de Kafka que não é apenas uma crítica ao humanismo em desespero de sobrevivência que temos hoje. Leila coloca dentro de seu cerebelo a seguinte questão:

Se a marginalização do sentimento passa necessariamente pelo visceral da violência, seriam então os seres humanos hoje máquinas que apenas conseguem sentir o extremo da vida quando essa violência, seja ela alegórica ou epidérmica, atinge seus corpos e mentes?

A questão é elevada pelas mãos do diretor Andre Okuma, com uma narrativa fragmentada e repleta em citações do chamado cinema marginal paulista. os filmes Bandido da Luz Vermelha, Bang Bang, Matou a família e Foi Ao Cinema aparecem. Também fotogramas de diretores seminais como Rogério Sganzerla, André Tonacci e Júlio Bressane estão presentes. Tudo rodado de uma maneira que possivelmente se o clipe fosse assistido ao contrário poderia passar até uma impressão de tempo mais exato. O que não é preciso, já que a assimetria é a única coisa real dentro do mundo pós moderno. Outra bela sacada é o trecho de Boca de Forno, composta por Luiz Gonzaga que aparece no filme Sem Essa Aranha de Sganzerla. Helena Ignez com a citação "o sistema solar é um lixo", fecha a artéria marginália.

Diante de todas as nuances fedorentas da realidade, Leila é um brado primal rústico em preto e branco, pulsa a capacidade do violentar a catarse nefasto burguesa que se encontra a medula torácida e hipercifótica do mundo da música.