CENA. SÃO PAULO. INT./EXT. DIA/NOITE.
Os olhos abertos, no calendário dia quarenta e oito de fevereiro de dois mil e vinte e quatro. O alarme não mais ressoa, martela. John Cale e seu Drone ressoam. As mãos aos fios de cabelo para depois perfazerem os olhos amontoados em restilo de sono. Um dedo correndo pela lateral da têmpora esquerda, encontra a curva da orelha que coça no mesmo tempo da luz refletindo no tímpano. Os sons do corpo lento, os cintilares do colchão de molas ensacadas e suas manchas na epiderme. Não lembrava se era café ou não, mas os dedos ainda procuravam fósseis dentro de suas entradas capilares. Fecha os olhos novamente e lateralmente vagueia seu corpo até encontrar a borda da cama, enquanto seus joelhos acertam um minúsculo ângulo de escape onde os artelhos consigam sentir completamente o piso gélido do quarto.
“I don’t know, just where I’m going.
But I’m gonna try for the kingdoom if I can”.
Os passos então entrelaçam a inércia
enquanto as mentiras enrolam a língua.
“’Cos it makes feel like I’m a man”.
Os pés então cortam o chão, descem as escadas.
Trôpegos se colocam “When I’m rushing on my run
violentos andares When I feel like Jesus son
enquanto mãos alcançam
a escova, passa pelos And I’ll tell you things
dentes, calça os sapatos, aren’t quite the same,
desentorta a gola When I’m rushing on my run
da camisa, When I feel like Jesus’s son
ajeita a barra calça, Well I guess I just don’t know
corre, Well I guess I just don’t know”
empurra o tempo,
lança a mochila, desafia
a gravidade das escadarias
enquanto transpõe por dentro
o muro da entrada, porém
escuta de novo aquela voz:
ONDE ESTÃO OS ORIGINAIS!!!!!
Enquanto o autor recorre ao controle de ansiedade para que possa caminhar com mais paciência, percorre mentalmente todas aquelas flores e folhas do calçamento. Os pedregulhos soltos e as formas saturadas das cores enquanto rios correm pelo meio fio. Somem preocupações enquanto recolhe seus pensamentos em Amanda, pois precisa permanentemente percorrer precoces pesadelos sobre ela estar ou não na porta de entrada da loja. Como o sol resvalaria nos tons vermelhos e como a luz se esconderia nas mechas ainda desbravando a coloração inicial. A calçada então se abre, lajotas elevam-se enquanto o autor gorjeia alguns sons como se fosse alvo trinado em tom menor vindo de um bambu rebatendo o vento de outono. Onde estará Amanda. Onde estará aquela torneira que ela tanto amava abrir e recobrir o apartamento de agrupamentos de água que quase não lhe cabiam nas mãos enquanto gritava que o autor precisava viver.
“I have made the big decision,
I’m gonna try nullify my life”.
Amanda corria, “Cause when the blood begans to flow
escorria pela When it shoots up the drooper’s neck
vida, recobrava When I’m closing in on death,
os tornozelos And you can’t help me
em pulos not you guys
assombrosos, or all your sweet girls with
enquanto movia your sweet talk
seus lábios You can all go take a walk
em mares and I guess I just don’t know
de cantigas and I guess I just don’t know
cantigas e
cantigas,
não há espaço
não há morte
não há sorte
apenas ela
apenas seu corpo
apenas seu nexo
o perplexo ser
enquanto ela explode
a vida nele.
Mas mesmo assim, aquela voz, aquela maldita voz:
ONDE ESTÃO OS ORIGINAIS AUTOR
ONDE ESTÃO OS SETE MIL REAIS AUTOR
AUTOR!
A voz em seu pescoço, o arremessa na parede lateral e tenta fugir desesperada pela rua. Não vê o caminhão de reciclados que passava e arrebenta sua coluna cervical, cortando sua cabeça. Ainda assim suplicava pelo autor.
FADE OUT.
Os olhos abertos, no calendário quarenta e oito de fevereiro de dois mil e vinte e quatro. O alarme não mais ressoa, martela. John Cale e seu Drone ressoam.